Política Nacional de Participação Popular e a Defensoria Pública

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Johny F. Giffoni e Marco Aurélio Guterres
Defensores Públicos do Estado do Pará
 
Historicamente, a luta pela afirmação dos direitos humanos está ligada diretamente à luta dos cidadãos que, em muitas situações, se veem impotentes, e, desta forma, organizam-se coletivamente.
Durante a Constituinte de 1988, presenciou-se o embate de diversos grupos diferentes na busca de direitos. Naquele momento tivemos reconhecidos na Constituição os direitos das mulheres, dos indígenas, dos deficientes, dos negros, quilombolas, crianças, idosos. Ainda, ficou asseverado a garantia de direitos sociais,  como a segurança, educação, saúde, previdência, trabalho e habitação. Outros direitos de ordem econômica também ficaram assentados, tais como, a livre iniciativa, o mercado, a propriedade, dentre todos.
A fim de garantir a executabilidade de todos os direitos e garantias previstos por parte da Administração Pública, a Constituição Federal, de forma explícita, previu princípios basilares ao administrador público, tais como: a publicidade, a moralidade, a legalidade e a impessoalidade.
Noutro norte, estabeleceu que todo poder emana do povo e que todas as políticas públicas executáveis pela Administração Pública visa garantir a dignidade da pessoa humana.
Uma vez que o povo é o titular do poder, exerce-o através de seus representantes eleitos. Contudo, estabeleceu a possibilidade de criação de mecanismos de democracia direta, como: iniciativa popular de lei, plebiscito e referendo.
Em que pese esses mecanismos de democracia direta, a Constituição Federal também não impediu que a legislação infraconstitucional criasse outros mecanismos de participação popular.
No ano de 2013, o povo brasileiro saiu às ruas protestando por melhor qualidade na prestação dos serviços públicos, bem como, exigiu a criação de espaços em que a população pudesse interferir diretamente na execução e elaboração de políticas públicas.
Eis que adveio o Decreto n.º8284/2014, em que institui a chamada Política Nacional de Participação Social (PNPS). A principal meta da Política Nacional é acompanhar a formulação, a execução, o monitoramento e a avaliação de programas e políticas públicas, assim como o aprimoramento da gestão pública.
O que o decreto visa é estimular a participação popular, em consonância com a previsão constitucional e com os anseios populares de 2013, aprimorando a relação do Poder Executivo Federal com a sociedade civil. Segundo o decreto, essa participação se daria por meio de um conselho de políticas públicas (cuja participação seria fundamental nas decisões de políticas públicas), uma conferência nacional (onde, com frequência regular, essa instância debateria, formularia e avaliaria as políticas públicas), uma ouvidoria federal e, por fim, audiências públicas.
A participação da sociedade civil na formulação e execução de políticas públicas não é algo recente em nossa democracia, outras legislações infraconstitucionais preveem a participação popular nas políticas públicas. De maneira exemplificativa, podemos citar a Lei Federal n.º 9.790, de 23 de março de 1999, que criou as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, e a Lei Federal n.º 9.637, de 15 de maio de 1998, que criou as Organizações Sociais. Possibilitando que as mesmas pudessem firmar termo de parceria e contrato de gestão com o poder público visando auxiliar o poder público na prestação e execução de atividades de relevância social.
Além disso,  outros dispositivos constitucionais trazem de forma implícita e explícita a participação popular, tais como nas diretrizes do Sistema Único de Saúde (Art 198, III, da CF/88); a Diretriz da Assistência Social (Art. 204, II, da CF/88); a Participação na Seguridade Social (Art. 194, parágrafo único, VII, da CF/88); a Participação no Sistema Nacional de Cultura (Art 216, § 1º, X, da CF/88); a  Participação nos órgãos públicos que tratam dos direitos previdenciários e profissionais dos trabalhadores; e a Gestão do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza (Art. 79, parágrafo único, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da CF/88).
Além da Constituição Federal, a participação social também é assegurada, no âmbito internacional, pelo Pacto de San Jose da Costa Rica, promulgado pelo Brasil em 1992 (ver Decreto Legislativo nº 27 de 1992):“Artigo 23 – Direitos políticos: 1. Todos os cidadãos devem gozar dos seguintes direitos e oportunidades: a) de participar da condução dos assuntos públicos, diretamente ou por meio de representantes livremente eleitos”.
Na região Norte, em especial, a Política Nacional de Participação Popular  tem papel de grande destaque e relevância, uma vez que permite à população desta região do país participar da vida pública, exterminando de vez práticas ultrapassadas ligadas ao coronelismo que maculam nosso Estado Democrático de Direito.
No tocante à Defensoria Pública, a existência dessa Política Nacional é de extrema importância e vai ao encontro dos seus objetivos. A Defensoria Pública tem como missão institucional, estabelecida Constitucionalmente, pelo art. 134:
“A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal”. (grifamos)
A Lei Federal Complementar n.º 80/94 estabelece que:
“Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: I – prestar orientação jurídica e exercer a defesa dos necessitados, em todos os graus;  II – promover, prioritariamente, a solução extrajudicial dos litígios, visando à composição entre as pessoas em conflito de interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais técnicas de composição e administração de conflitos;   III – promover a difusão e a conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do ordenamento jurídico;   VII – promover ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes;    VIII – exercer a defesa dos direitos e interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos e dos direitos do consumidor, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal;  X – promover a mais ampla defesa dos direitos fundamentais dos necessitados, abrangendo seus direitos individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e ambientais, sendo admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela; XI – exercer a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado; XVIII – atuar na preservação e reparação dos direitos de pessoas vítimas de tortura, abusos sexuais, discriminação ou qualquer outra forma de opressão ou violência, propiciando o acompanhamento e o atendimento interdisciplinar das vítimas;   XX – participar, quando tiver assento, dos conselhos federais, estaduais e municipais afetos às funções institucionais da Defensoria Pública, respeitadas as atribuições de seus ramos; XXII – convocar audiências públicas para discutir matérias relacionadas às suas funções institucionais”.
Vê-se que com o novo plano, a Defensoria Pública encontra legitimidade para participar da formulação, execução e avaliação das políticas públicas existentes, onde tem assento nos mais diversos conselhos federais, estaduais e municipais previstos.
Além disso,  a Defensoria Pública, como instrumento de política pública que visa assegurar os direitos humanos e o acesso à justiça, tem como mecanismo de participação popular a Ouvidoria Externa. Órgão de alta relevância institucional o qual cumpre, em conjunto com a Administração Superior, participar do processo de formulação, implementação, execução e avaliação da política pública defensorial.
Portanto, a instituição da Política Nacional de Participação Social nada mais é que um instrumento normativo que visa da executabilidade a diversos mandamentos constitucionais que preveem ao cidadão o poder de participação da política pública nacional, ressalvando que esta forma democrática de participação vai ao encontro dos objetivos e fundamentos da República, sendo da mais alta relevância para assegurar os direitos fundamentais individuais e sociais existentes em nossa Ordem Constitucional.
Desta forma, a Associação dos Defensores Públicos do Estado do Pará se pronuncia favoravelmente ao Decreto nº 8243/2014 (Política Nacional de Participação Social), pela importância da participação da sociedade civil na elaboração e execução das políticas públicas, pelo asseguramento dos direitos fundamentais, bem como, pela garantia de prevalência dos princípios constitucionais da Administração Pública.