O dia 08 de março é data comemorativa, mas ainda é um dia de reflexão e de fortalecimento da luta pelo fim da discriminação que coloca a mulher em condição de inferioridade na sociedade. A Lei nº 11.340/2016, conhecida como Lei Maria da Penha, veio para prevenir, punir mais severamente e erradicar a violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil. Depois de uma década em vigor, que balanço podemos fazer entre a garantia legal e a realidade vivenciada em nossa sociedade?
Tão logo foi promulgada, a Lei nº 11.340 com vigência, a partir de 22 de setembro de 2006, a administração superior da Defensoria Pública do Pará, à época, nomeou a Defensora Pública Arleth Guimarães na qualidade de Defensora referência para atuar junto ao Poder Judiciário, Ministério Público e DEAM (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) aqui no Estado do Pará.
Em 2008 foi implantado o Núcleo de Atendimento Especializado às mulheres, vítimas de violência doméstica e familiar “NAEM”, colocando em prática a nova ordem legal como um dos meios eficientes de combate à violência contra a mulher.
Consciente de seu papel na rede de serviços, a Defensoria disponibilizou recursos materiais e humanos para o enfrentamento da violência contra a mulher, colaborando com o sistema na instituição de Políticas Públicas sérias e comprometidas com a luta, políticas que colocam a mulher em um meio saudável e harmonioso, e que promovam o acompanhamento social e psicológico. Assim, a instituição continua contribuindo para a ruptura da situação de violência, o fortalecimento da rede de serviços e a construção da cidadania por meio de ações preventivas e de atendimento jurídico e interdisciplinar à mulher em situação de violência doméstica e familiar em Belém.
Para a Defensora Pública aposentada e Diretora dos Aposentados da ADPEP, Arleth Guimarães, apesar do texto da Lei conter dispositivos de tecnicidade jurídica questionável – e que ainda levam juízes e tribunais a infindáveis debates, como ocorre com a questão da aplicabilidade da lei ao homem nas relações homossexuais, a competência mista dos juizados – o mesmo tem o mérito de ter trazido o problema da violência doméstica contra a mulher para o debate público, popularizando a questão e gerando interesse no tema. “A lei ganhou uma enorme popularidade e foi considerada entre as três melhores do mundo, mas sua popularidade não basta para a erradicação desse mal. Ainda precisamos de infraestrutura, de mecanismos que nos permitam dar melhor assistência às mulheres vitimizadas”, destaca a Defensora.
De acordo com a análise da Defensora Pública, os avanços ocorreram, mas ainda são tímidos e a demanda continua crescendo. “Ainda temos pouco pessoal para o atendimento, os juizados ainda atendem só as questões de natureza criminal e com isso nos deparamos com decisões judiciais dando a guarda ao agressor, quando na Vara especializada ele está sendo processado por violência contra a família”.
A Defensora Pública lembra que ao longo da história a mulher foi tratada como subordinada e isso fez com que fosse perdendo voz na sociedade. Ela acrescenta que “isso é uma cultura, e quando a gente não trabalha seriamente para tentar quebrar uma cultura, a tendência é se perpetuar. Até hoje não conseguimos fazer isso”. Para ela, é uma luta muito grande, e essa luta pelos direitos da mulher ainda está longe de terminar. “A Lei veio justamente para isso, mas ela não vai conseguir sozinha romper e acabar com essa desigualdade entre homens e mulheres. Para acabar com essa cultura de inferioridade é preciso mais políticas públicas que, integradas com a lei,cheguem aos objetivos de prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher”, analisa.
A esperança da Defensora é de que um dia não seja mais preciso recorrer a Lei para que a mulher seja tratada como merece. Além disso, a luta não é para querer ser ou ter direitos maiores do que os homens, mas sim igualar os direitos e respeitos da sociedade. “Não estamos lutando contra os homens para querer o lugar deles ou para ser melhor que eles. A gente luta em prol de uma igualdade, e que essa igualdade venha romper toda essa cultura que foi criada desde os primórdios da civilização. Temos uma lei que fala em prevenir, punir e erradicar. Erradicar quer dizer extinguir, acabar com a violência. Que fica um pouquinho além do que a gente quer agora, de imediato, porque a caminhada é longa, vagarosa, lenta, mas não impossível. Assim, o dia que a mulher for tratada de forma igualitária em direitos e deveres, não precisaremos mais de leis para nos obrigar a isso”, ressalta Arleth.
A Defensoria Pública continua realizando palestras nas escolas com o objetivo de mudar a cultura machista e patriarcal que ainda impera no País e submete as mulheres enquanto propriedade do poder masculino, pois acredita que unindo o conhecimento à prevenção, o caminho será mais curto para garantir direitos iguais a todos e a todas. “O que falta fazer é muito simples: as instituições que trabalham a questão da violência contra mulher precisam se fortalecer, capacitar seu pessoal colocando pessoas comprometidas no seu quadro. É preciso também levar esse trabalho de prevenção para as escolas, faculdades, instituições, e mostrar para eles o que está acontecendo no dia-a-dia, ou seja, a realidade, e assim não será preciso muito tempo para que toda essa cultura mude”, destaca.
“Ser mulher é ser forte sem perder a sensibilidade, nunca ter medo dos desafios, conquistar seu espaço e lutar, permanentemente, por respeito e igualdade com o sexo oposto”.
Arleth Guimarães