Johny Giffoni, Defensor Público do Estado do Pará, esteve em Luziânia (GO), participando da segunda edição do curso de extensão em Histórias e Culturas Indígenas, uma parceria do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) com a Universidade de Integração Latino-Americana (Unila). O evento encerrou no dia 28 de julho e reuniu 38 pessoas de 15 estados do país, onde permaneceram por três semanas no Centro de Formação Vicente Cañas.
Durante a programação, os participantes debateram sobre: História e Resistência Indígena, Conjuntura Política Indigenista, Terra, Território e Territorialidade e sua relação com os projetos de Bem Viver, Direitos Indígenas, Antropologia Indígena e questão metodológica do ensino da História Indígena nas escolas.
Com essas temáticas, o curso ofereceu formação para apropriação de referenciais conceituais e legais que permitem o conhecimento e valorização da sociodiversidade indígena, para a desconstrução de noções equivocadas e preconceituosas sobre as comunidades e povos tradicionais. As aulas buscaram valorizar a multietnicidade e a pluralidade cultural. As realidades contemporâneas dos Povos Indígenas no Brasil nas propostas pedagógicas das escolas também estiveram presentes nas grades das aulas.
Além da contribuição com o pensar a pluralidade sociocultural do Brasil, reduzindo assim o preconceito contra os povos indígenas, o curso auxilia na difusão do projeto da Unila e do Cimi, valorizando as parcerias com movimentos sociais e auxiliando na capacitação de multiplicadores sociais na temática da diversidade étnica.
Enquanto, no Congresso Nacional, avançam políticas que violentam os direitos dos povos tradicionais, indígenas e indigenistas gestam forma de resistência nos espaços de conhecimento e luta. No Pará, por exemplo, o defensor público Johny Giffoni busca alternativas em sua atuação jurídica para incrementar práticas que respeitem a organização social e cultural dos povos indígenas. “É preciso fazer Direito com outro paradigma de pensamento, que venha conceber uma sociedade mais justa. Quando a atuação é junto aos povos indígenas, necessariamente devemos conduzir nosso fazer a partir de suas realidades”, expressa.
Para Johny Giffoni, a participação no curso é resultado de um trabalho que já vem sendo feito através da CIME da Regional Norte II, o que se tornou uma nova fonte de conhecimento sobre os direitos indígenas. “Isso foi um reconhecimento, de uma certa forma, participar desse evento. Para mim, enquanto Defensor Público, que estou trabalhando com essa área indígena e que aprendi isso sozinho com livro e leituras, participar desse trabalho que vem sendo feito pela Regional Norte II e ter a oportunidade de ser selecionado para o curso foi muito bom porque me deu esse aspecto mais amplo da questão indígena. Então eu fiquei muito feliz”, destaca.
Até então, o Defensor havia participado de eventos de curta-duração, como palestras, convenções, bate-papos, oficinas e até mesmo conferência. No entanto, segundo ele, passar 18 dias com pessoas de vários estados e que são especialistas no assunto foi enriquecedor. “Eu aprendi muito mais do que falei. Pude aprender sobre outras perspectivas da cultura indígena e conhecer um pouco mais das doutrinas, das teorias, das formas de pensar o indigenismo no Brasil e na América Latina, até porque haviam pessoas com conhecimentos diferentes, aprendizados diferentes e muita experiência na ‘bagagem’, pessoas que estão lutando pela valorização do direito indígena, pela cultura e pelas tradições de todo o Brasil”, contou.
Foram seis disciplinas distribuídas em 140 horas aulas presenciais, que se estendeu de 10 a 28 de julho. As demais 40 horas aulas implicam na produção de um artigo ou projeto de intervenção no contexto de cada estudante, orientados pelo corpo docente do curso. Além de professoras (es) e pedagogas (os), que somam 52% dos intencionistas, participaram do curso indígenas, indigenistas, historiadores, estudantes, advogados, produtores culturais, agrônomos, e membros de movimentos e pastorais sociais.
Ataques ao projeto pedagógico da Unila
Histórias e Culturas Indígenas ocorre em um contexto onde busca-se silenciar práticas de integração da América Latina, que pensem e debatam a vida dos povos originários deste continente. A fundação da Unila, em 2010, representou um importante passo para o fortalecimento latino-americano, como um fator de poder para o futuro comum da América Latina. Contudo, a afirmação da vocação e identidade ameríndia incomodou representantes do colonialismo e da dependência. Em abril deste ano, Álvaro Dias (PV-PR) apresentou um projeto para que a universidade sofresse modificações no seu projeto pedagógico. Representante do latifúndio, Álvaro Dias é um dos mencionado em gravações originadas na Operação Lava Jato.
“Acompanhamos o avanço de um projeto conservador e neoliberal em nosso país. Isso acontece com força no Congresso e incide em entidades menores, como universidades federais e estaduais. Os ataques a Unila estão nesse contexto. Desejam que ela perca sua configuração de interação com o pensamento da América Latina. Isso vem sendo posto em disputa por um projeto conduzido por bancadas como a do agronegócio”, ressalta Jessica Marques, militante do Levante Popular da Juventude.
Ao findar o curso, em nota pública, os cursistas da segunda edição solidarizam-se com os professores e alunos da instituição e reafirmam a importância da universidade para a promoção do pensamento latino-americano. “O principal argumento apresentado é modificar completamente o projeto de Unila e transformá-la em produtora de mão de obra para o agronegócio”, denuncia a nota ao repudiar a iniciativa de alterar a opção pedagógica. “O próprio curso de extensão é uma demonstração fundamental do quanto a Unila e seu projeto e atuação é de extrema relevância não apenas para a região oeste do Paraná, mas para o Brasil e demais países latino-americanos”, pontua o texto.
Leia a nota abaixo:
Nota Pública em defesa da Unila e sua opção latino-americana
Os estudantes do curso de Extensão em Histórias e Culturas Indígenas, oferecido pela Universidade Federal da Integração Latino-Americana em atendimento a Lei nº 11.645/2008, vêm a público manifestar-se contra os ataques em curso que desejam acabar com o projeto da Unila de pensar uma nova relação latino-americana construída a partir das epistemologias regionais. Somos professores, educadores populares, defensores dos direitos humanos, defensores públicos, eclesiásticos de 15 Unidades da Federação que nos interessamos pelo curso oferecido pela Unila e estivemos, desde o dia 10 de julho, estudando a temática indígena.
Acompanhamos atentamente e repudiamos os ataques verbais do senador da República Álvaro Dias (PV-PR) alegando que a Unila tem “funcionamento atípico” e que vive uma “crise permanente”. Essa ofensiva veio a somar-se a mais um ataque desferido pelo deputado Sergio Souza (PMDB-PR) ao propor uma “Medida Aditiva” a “Medida Provisória Nº 785, de 2017 a fim de “criar a Universidade Federal do Oeste do Paraná (UFOPR)” com a incorporação da Unila, que segundo o deputado, a universidade “funciona aquém do potencial para o qual foi concebida”.
O principal argumento apresentado é modificar completamente o projeto de Unila e transformá-la em produtora de mão de obra para o agronegócio, como argumenta o pmdebista: “Tais fatores demandam, sem sombra de dúvidas, a necessidade de mão de obra qualificada na região para a demanda da cadeia produtiva e também do incremento do terceiro setor que acompanha naturalmente o desenvolvimento do setor produtivo”.
O próprio curso de extensão é uma demonstração fundamental do quanto a Unila e seu projeto e atuação é de extrema relevância não apenas para a região oeste do Paraná, mas para o Brasil e demais países latino-americanos. Mais do que formar mão de obra, precisamos de pessoas capacitadas para pensar as sociedades e auxiliar a superar a grave crise humanitária e ambiental que passamos.
Nesse sentido, nos unimos a comunidade acadêmica da Unila (alunos, técnicos e professores) e a sociedade brasileira na defesa da manutenção e apoio esta importante instituição de ensino, pesquisa e extensão. Repudiamos aos ataques verbais e através de ações parlamentares sem qualquer debate com a comunidade universitário e com a sociedade brasileira.
Alunos da 2° edição do curso de extensão em Histórias e Culturas Indígenas
Luziânia (GO)
28 de julho de 2017
Com informações do CIME – Conselho Indigenista Missionário