A Associação Nacional dos Defensores Públicos – ANADEP – vem a público apresentar seu posicionamento acerca do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Habeas Corpus 126.292 no último dia 17 de fevereiro, no qual reconheceu-se a possibilidade da execução provisória da pena após o julgamento em segunda instância, ou seja, cumprimento da pena sem o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Inicialmente, observa-se que o entendimento contraria a literalidade do artigo 5º, LVII, o qual dispõe que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” e o artigo 11.1 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o qual estabelece que “Todo o homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias a sua defesa”.
Além disso, a prisão automática por simples julgamento de segunda instância contraria a excepcionalidade constitucional da privação da liberdade, uma vez que o artigo 5º, LXI, assevera que a prisão cautelar deve ser escrita e fundamentada, não podendo ser automática, sem a análise do caso concreto.
No seu mister de educar em direitos a comunidade, os Defensores Públicos alertam que o entendimento firmado repercutirá que mais inocentes fiquem encarcerados, tendo sua absolvição reconhecida somente nos tribunais superiores, oportunidade em que já terão sofridos vários danos irreparáveis, sobretudo porque a vida e a liberdade são bens que o tempo não devolve.
Assim, para a sociedade, a aparente celeridade, em pouco tempo, produzirá um sentimento de frustrações e descrenças com o sistema de justiça brasileira, ante a flagrante violação aos direitos humanos.
Para o Estado, além da despesa com inocentes nas prisões, parte da receita adquirida com o esforço do contribuinte, será remetida para pagamento de indenizações aos cidadãos que forem presos por conta de erro do Estado e além do tempo fixado no julgamento definitivo (art. 5º, LXXV), quando tais recursos financeiros deveriam ser aplicados no fortalecimento do Estado social, sobretudo saúde e educação.
A morosidade da justiça brasileira não deve ser lançada na conta daqueles que exercem a defesa dos acusados, mas deve provocar reflexão em todo o sistema de justiça. Afinal, não se pode permanecer a ideia de “recursos protelatórios”, quando as estatísticas demonstram que a maioria dos recursos interpostos pela Defensoria Pública nos tribunais superiores são providos, sem falar do alto número de 25% das pessoas que chegam “condenadas” nos Supremo Tribunal Federal alcançam sua absolvição, o que revela a fragilidade das instâncias ordinárias da justiça brasileira.
Por fim, os defensores públicos reconhecem a importância de cessar a “cultura da impunidade”, mas esta só será efetivada com justiça e paz social, quando respeitados todos os direitos fundamentais e garantias constitucionais (dentre eles, o princípio da presunção da inocência).
Somente assim, a Constituição da República será respeitada, e o Estado, a Sociedade e o Cidadão terão a segurança que as penas serão aplicadas a quem realmente é culpado, sem que inocentes sejam lançados no sistema carcerário brasileiro.
Fonte: ANADEP