Na última sexta-feira, 21, ocorreu uma audiência pública no plenário Aldebaro Klautau da sede da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Pará, para tratar sobre alguns pontos que constam no relatório com relação à situação carcerária no estado, no que tange à Defensoria Pública e a defensores públicos, citados no documento.
A reunião foi presidida por Jarbas Vasconcelos, presidente da casa, e a mesa foi composta por membros da diretoria e do Grupo de Monitoramento do Sistema Carcerário da OAB-PA, que produziu o relatório. Mais de dez defensores compareceram à sessão para dar seus depoimentos e solicitar à OAB que fossem tomadas providências a respeito de opiniões emitidas no documento que denigrem a imagem dos profissionais e da instituição, de acordo com os defensores.
O presidente iniciou a audiência informando que o sistema carcerário do Pará tem déficit de assistência jurídica, déficit de defensores públicos “e isso acontece porque temos uma defensoria pequena que precisa crescer. A OAB pede que o estado seja compelido a dar atenção à Defensoria Pública. A OAB está favorável à Defensoria”.
Em seguida, o representante da administração da Defensoria Pública, Adalberto Souto, disse que os defensores gostariam de um “guarda-chuvas” da OAB, a mesma garantia de um advogado particular tem. “O que estamos discutindo não é a importância da instituição e sim que deveria ser ouvida a outra parte para incluir no relatório. Peço que analise e veja o que pode ser feito para que não se cometa injustiça”, finalizou o sub-defensor passando a palavra para o diretor metropolitano, José Adaumir Arruda.
Este iniciou dizendo que não se estava discutindo a necessidade de ter um relatório e sim a metodologia adotada e a respeito do trabalho dos defensores em casas penais. Segundo o defensor, o documento pode e deve conter sugestões mas não críticas e opiniões pessoais como se faz presente. “Foram sete os equívocos que não correspondem ao trabalho da Defensoria Pública. Há informações no relatório que não condizem com a realidade. Agradecemos o esforço da OAB com relação à autonomia da Defensoria e não queremos criar atrito mas a assistência jurídica não se dá apenas presencialmente, quando o defensor analisa o processo também é assistir”, disse Adaumir. Exemplificando através de dados e relatórios, o diretor metropolitano lembrou que são 21 defensores atuantes na área criminal pedindo a retirada de opiniões e que houvesse um desagravo aos profissionais citados no relatório, citações estas que “desmoralizam a imagem pessoa e profissional”.
A palavra foi passada ao relator do caso e diretor tesoureiro da OAB, Eduardo Imbiriba, que informou que em nenhum momento o objetivo foi atacar e sim verificar a situação do sistema carcerário e diante disto estava a situação da Defensoria Pública, “que ainda não tem o que deveria ter”. E seguiu dizendo que “em nenhum momento a Ação Civil Pública ataca à Defensoria Pública. Se alguns defensores se sentiram atacados a Ordem também se sentiu pela situação criada. Nós também temos direito de nos defender e estamos expondo”. Neste momento a audiência passou a ficar um pouco tensa, pois o diretor informou que o ataque à Ordem foi através de redes sociais e os defensores presentes não concordaram, dizendo que não é o canal oficial da Defensoria.
Em seguida, o diretor jurídico da Associação dos Defensores Públicos do Estado do Pará (Adpep), Edgar Alamar, disse que acreditava não ser a intenção atacar defensores e Defensoria mas quem lê o relatório percebe que colegas foram atacados na sua atuação profissional. “Extrapolou o limite institucional e pedimos a exclusão de determinados itens”. Alamar terminou lendo uma carta de apoio aos defensores assinada pela Presidente da associação local (Adpep) e pela Associação Nacional da categoria, ANADEP.
Ao pronunciar-se, a defensora Ana Isabel Santos informou que se os profissionais estavam participando da audiência foi pelo motivo de que a nota de esclarecimento publicada pela OAB não havia sido satisfatória. “No relatório consta que eu nem sequer vou ao presídio. Entreguei relatório de mais de 650 presos que atendi, onde consta as atividades feitas e isso não foi analisado. Se há carência de defensor público não é culpa do defensor é da instituição, que deve se preocupar com a Execução Penal. Não tenho culpa se nas minhas férias não tem defensor. O que quero é pelo menos um desagravo da Ordem”, disse a defensora atuante na área de Execução Penal.
Membro da comissão que produziu o relatório e também ouvidora geral da Ordem, Ivanilda Pontes, reafirmou que a comissão não foi aos presídios para atacar os defensores e que não esperava o ataque da Defensoria. “Este é o pior momento do sistema carcerário. A gente precisa reunir forças para melhorar a vida do preso. A Defensoria não tem condições, não pelo defensor mas pela instituição, de atender 12 mil presos, temos que fazer alguma coisa”, declarou a ouvidora.
Em seguida, o defensor público também atuante na Execução Penal, Eduardo Barros, disse que havia duas inverdades a respeito de seu trabalho no relatório produzido pela OAB. “Uma é que eu me recuso atender casos provisórios; não é de minha atribuição atender provisórios porque minha prioridade são as condenadas e mesmo assim atendo provisórias e tenho como provar. Dois, que coloco pessoas sãs em hospital de custódia; tenho como provar que acompanho os casos e como é feito o trabalho”, defendeu-se Eduardo, concluindo que o relatório é válido “mas dizer que o defensor está sendo omisso, não é verdade”.
Adriano Souto também esteve presente e questionou a metodologia utilizada. “Nenhuma”, ele mesmo respondeu. “Quando perguntamos aos presos eles dizem que não tem assistência jurídica mas quando vamos pesquisar vemos que não é bem assim. Se a comissão tivesse tido precaução, não havia colocado nomes de defensores”, declarou com indignação o defensor. Adriano relatou que ele e outro colega pediu interdição do Centro de Triagem de São Brás em determinada época mas a comissão da OAB foi ao local e não constatou as condições informadas pelos defensores. Segundo ele, as mesmas condições constam hoje no relatório. “Pedimos a retratação da OAB perante os defensores da Execução Penal para que relatórios como esse não sejam mais publicados, denegrindo a imagem e afetando psicologicamente profissionais”, finalizou.
“É muito difícil vir hoje como defensora pública na condição desse relatório”, disse Eliana Vasconcelos. De acordo com o seu depoimento, consta no relatório que presos do Hospital de Custódia estavam sem assistência jurídica, onde atua. “Meu nome não foi citado mas minha atuação sim”, declarou a defensora que se disse surpresa quando leu no relatório que a sua instituição (a Defensoria) não é digna de confiança. Ela também solicitou a revisão do relatório. “Exatamente pela seriedade desta casa e pelo respeito que tenho, peço que julgamentos de valor deixem de constar no relatório”, finalizou.
O próximo defensor público a falar foi Arthur Correa da Silva Neto, que sugeriu que se deveria fazer uma análise mais ampla, uma análise jurídica, incluindo os outros poderes. “O relatório perdeu a oportunidade de dar passos ao largo com relação ao regime semi-aberto”.
O último defensor público a falar foi Marcos Vinícius. Ele corroborou com os colegas informando que se deveria ter tido melhor cuidado na apuração das informações e que não se está pedindo nada a mais de que conste a verdade no relatório. “Somos irmãos mas é assim que se trata um irmão? Não quero que passe a mão na nossa cabeça mas poderiam colocar ‘apesar do empenho dos defensores públicos ainda não é possível atender todo o sistema carcerário’. Nós que trabalhamos em casas penais sabemos que corremos riscos, de vida inclusive, mas não de sermos atingidos pela OAB. Espero que ocorra a retratação e que haja um maior diálogo com a Defensoria”, declarou o defensor.
Ao tomar a palavra, Jarbas Vasconcelos disse que havia uma incompreensão sobre o trabalho da comissão, informando que não foi realizado para apurar condutas e sim para verificar como está o sistema carcerário, através de visitas, observando que este é o método que o CNJ usa. “O relatório será enviado à Corregedoria da Defensoria Pública, que vai apurar o que consta sobre os defensores. Tudo vai fazer parte da nossa ACP. Acho que não gostariam que nós apurássemos a conduta profissional. A OAB expôs a situação atual das casas penais e que a assistência jurídica é insuficiente”. O presidente da Ordem disse ainda que o relatório será apresentado nesta terça-feira, 25, ao Conselho Federal, pela presidente do Grupo de Monitoramento do Sistema Carcerário, Ivanilda Pontes.
Ao finalizar, Jarbas disse ainda que não via um motivo para uma discussão tão dura. “Estamos do mesmo lado. Não temos pretensão de atacar ninguém. Vocês podem participar de nossas comissões, podemos discutir um novo método. Espero que possamos tirar daqui um amadurecimento. Agradeço e peço desculpas se alguém se sentiu ofendido”.
O diretor metropolitano, Adaumir Arruda, pediu a palavra novamente e disse que o que se esperava era emendas no documento. “Subjetividades não deveriam prevalecer, não tendo reparação saímos frustrados, pois nossa expectativa é que tivéssemos apoio”.
Jarbas respondeu informando que se poderia deliberar e levar ao conselho mas reafirmou que não cabe à OAB julgar o trabalho do defensor. “O objetivo não é expor o contraditório”.
Indignados, defensores retiraram-se do plenário. Arruda e Marcos Vinícius ainda tentaram expor seus pontos de vista mas não tiveram sucesso. Ivanilda, membro da comissão, disse que a culpa não é da Defensoria Pública e sim do estado mas o que consta no relatório não é mentira. Jarbas finalizou a audiência dizendo “ninguém quis expor nenhum defensor, temos que ver o todo mas só está se vendo o ‘eu”.
Diante do embate, haverá uma Assembleia Geral na próxima sexta-feira, 28, quando defensores discutirão sobre a desvinculação da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Pará.