Nesta quarta-feira (26) comemora-se o Dia Internacional da Igualdade Feminina, data de reflexão sobre as transformações ainda em pauta para a plena igualdade entre homens e mulheres. Segundo a última pesquisa do Fórum Econômico Mundial (WEF), o mundo ainda terá de esperar 257 anos para alcançar a paridade entre homens e mulheres. O relatório anual do órgão, elaborado em 153 países, contempla essa paridade nas áreas de saúde, educação, trabalho e política. Segundo a Defensora Pública paraense Rosemary dos Reis Silva, membro da Comissão da Igualdade Étnico-Racial da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (ANADEP), a disparidade é acentuada duas vezes mais quando se é mulher negra. Ela defende a necessidade das mulheres participarem mais da política, pois elas ainda são minoria nos cargos eletivos apesar de serem a maioria do eleitorado brasileiro, conforme mostrou a pesquisa do TSE divulgada no início deste mês.
A última pesquisa do IBGE Desigualdades Sociais por Cor ou Raça, publicada em novembro do ano passado, confirma que a desvantagem feminina no Brasil se acentua quando se é mulher negra. As negras recebem menos da metade do salário dos homens brancos (44,4%), que ocupam o topo da escala de remuneração no país. Sendo ainda mais específica, a escala da desigualdade revela que negras ganham menos que homens negros, que são mais mal remunerados que as mulheres brancas.
A Defensora Rosemary explica que, seja no Pará ou em qualquer outro estado, as mulheres negras travam lutas diárias para romper as opressões estruturais estabelecidas na sociedade brasileira. “Para além da discriminação de gênero e de classe, as mulheres negras são atravessadas pelo racismo. Portanto, a experiência de ser mulher negra é particular, por conta das condições de vida e das relações de poder, e, por isso, as questões que dizem respeito a nós, negras, devem ser analisadas de maneira interseccional e não isoladamente”, avalia.
A desigualdade é clara no mercado de trabalho, frisa a Defensora. Segundo ela, para cada R$1.000 recebidos por um homem branco, são pagos R$758 para mulheres brancas, R$561 para homens pretos ou pardos e R$444 para mulheres pretas ou pardas. “Essa diferenciação se mostra ainda na ocupação de cargos gerenciais. Quase 70% das vagas são para brancos e menos de 30% para pretos e pardos, o que é ainda pior em se tratando de mulher negra”, diz.
Essa realidade pode ser mudada quando mais mulheres ocuparem cargos políticos e de decisão, avalia a Defensora. Ela cita os dados do TSE divulgados no dia 05/08/2020 segundo os quais as mulheres ainda são minoria nos cargos eletivos, apesar de serem a maioria do eleitorado brasileiro. Elas são 52,49% do total, enquanto os homens somam apenas 47,48%. “É necessário e urgente, portanto, incentivar o aumento da participação das mulheres no cenário político e garantir a transparência e investimento nas candidaturas femininas, para que possamos caminhar para um equilíbrio entre o número de eleitoras e o número de mulheres em cargos eletivos”, considera.
A professora paraense pesquisadora feminista Drika Sá explica que é menor a presença das mulheres nos campos político, econômico e educacional por causa do papel social que é imposto ao público feminino. “A nós é delegada a função do cuidado, do servir, do ser mãe, esposa e ademais funções que são desenvolvidas no âmbito privado. Gênero é uma questão política aguda, reflexo de um comportamento social enraizado sobre o qual as hierarquias de gênero se assentam e precisam ser combatidas”, esclarece.
Nesses papéis tradicionais de gênero as mulheres abarcam o dobro dos homens, ressalta Drika. Elas gastam em média 21h semanais desenvolvendo trabalhos domésticos não remunerados, que as feministas chamam de “trabalho invisível”. Para estes mesmos trabalhos os homens gastam cerca de 10h semanais. “Ou seja, a desigualdade já é posta no âmbito privado. E as configuração de fronteiras entre esfera pública e privada implicam em lugares distintos para homens e mulheres”, explica.
“Levando em consideração estes dados entendemos porque nós, mulheres, somos minorias nos espaços de poder, ou seja, nos locais onde as vidas são decididas, inclusive as nossas, sem a nossa presença. E as mulheres negras são as maiores vítimas. Elas ocupam apenas 6,3% dos cargos de gerência e 4,7% de cargos executivos. Geralmente quando ocorre a inclusão de gênero, ela é de mulheres brancas, e não de negras”, diz Drika.
Segundo ela, quando as mulheres se tornam mães as chances ficam ainda mais díspares, ou seja, são penalizadas e têm o acesso a cargos de liderança negados. “A nós são relegadas funções tidas como femininas, sendo essas profissões atreladas ao cuidado como professora, enfermeira, psicóloga, funções diretamente ligadas ao ‘trabalho de mulher’, e isso diz muito sobre discriminação de gênero”, explica.
Por fim, para o fim dessas desigualdades, Drika sugere o investimento em políticas públicas que promovam a equidade entre os gêneros e um maior incentivo à divisão das tarefas domésticas. “É necessária licença parental, para que haja uma divisão igualitária de tarefas entre homens e mulheres e o Estado precisa promover possibilidades para que mulheres\mães possam permanecer no mercado, não o contrário. Com isso, é preciso um maior número de creches para que tenham onde deixar seus filhos. Essas políticas públicas serão eficazes para combater as assimetrias sociais”, conclui.
Em comemoração ao Dia Internacional da Igualdade Feminina e aos 14 anos da Lei Maria da Penha, a Associação das Defensoras e Defensores Públicos do Pará (ADPEP) e a Deputada Marinor Brito promovem na sexta-feira (28) uma mesa redonda com o tema “Mulheres Corajosas, Mulheres Sobreviventes”. O evento ocorrerá às 9h no auditório João Batista da Assembleia Legislativa do Pará (ALEPA). A programação aberta ao público tem o apoio da Defensoria Pública do Pará.